domingo, 4 de dezembro de 2016

Vontade de chupar moluscos


essa buceta que conheço 
com a ponta dos dedos 
e todas as papilas gustativas de minha língua
até as queimadas pelo café 
na ânsia pelo quente 
essa minha buceta que tu conhece
com a ponta dos dedos indicador e do meio
da mão direita e principalmente esquerda
sempre na alternância entre agarrar meus seios 
e todas as papilas gustativas 
que sabem de cinco gostos
sendo o quinto desconhecido 
nas descrições de críticos gastronômicos 
e declarando como favorito o gosto
de minha buceta 
derramando lubrificações 
que nem ká.ipsilow nenhum nem cuspe
nem saliva na ponta de tais dedos 
indo de sua boca a minha buceta reproduz

sábado, 3 de dezembro de 2016

Veja só Eugênia

 


levantar bem alto braços 

esticar feito gato preguiçoso no sol

clec e vértebra rearranjada

cresce dois centímetros 

a respiração presa solta

torcer retorcer 

punho calcanhar junta

rodar pescoço sobre ombros

subir um degrau porveiz

caminhar até o centro

passar a perna pelo balaústre

como quem monta cavalo ou seu homem

pra gozar por cima

seios pulando cabelos soltos 

e saltar do alto do viaduto santa ifigenia com i

cantarolando adoniran barbosa 

sábado, 26 de novembro de 2016

Sala de supervisão operacional


"talvez seja 

a última vez

que vocês possam

estudar

literaturas africanas 

tudo o que

é progressivo 

vai desaparecer 

entre bilhetes e trocos

a fala dela

me preocupa

assim como as 

feridas brotando 

e a coluna

que ontem parecia que 

ia romper

mas não rompeu

só a vontade de

mandar a merda

o médico

ironizando a dor

nunca precisou 

entregar atestado

e meu ódio de classe

me fazendo chorar

de raiva 

na sala de espera 

e hoje quase 

chorei de novo

ela dizendo 

deixei toddynho

pra você

na éssi éssi ó 

temer calibre 16



eu chorei na vontade de fuder

de baixo do chuveiro e ele

me abraçou e pediu 

calma 

discutindo com um deus que não 

existe e nem acredito 

porque marxista e

não sei se subjetivo ou 

expressão da conjuntura política 

mas apontava um revólver pra

cabeça se tivesse um

revólver mas não

vou roubar o revólver do

meu tio que de paletó pediu

impeachment na paulista e

dar saída individual pra

toda essa dor 

Frevo de suicídio

 


"Onde eu estava quando meus amigos tentavam se matar?"

onde meus 

amigos estavam quando eu 

tentava me matar?

ela me deu a resposta 

simples todos

pensavam na morte eu

podia ouvir taxi

lunar se repetindo o

dia inteiro mas

já não consigo ensaiar os

passinhos do frevo ao

som de elba os

meus pés só sabem

agora se enrolar pra dormir

meio frontal já 

é suficiente e pensei

se conseguiria me 

matar segurando nos

fios de alta tensão do

muro do prédio vizinho da

casa dos meus pais onde

eu já não tenho cama pra mim 

ou se eu vomitaria todos 

os remédios antes de 

eles pararem meu coração 

Harakiri de Cortazar


vontade danada 

de arrebentar a mandíbula

dividir em duas partes pra

ver se liberta sapo

peixe ou Coelho 

que carrego escondido na

garganta

vontade danada de

martelar o esterno com

marreta ou bigorna

pra vomitar o que nem

com anti ácido quer

sair qualquer coisa 

vomito ou diarreia 

simular caganeira

faltar no serviço e

tomar soro expurgar 

tal demônio na 

região abdominal ou cortar

com espada feito

samurai Japones e 

observar entra as vísceras esse

bicho teimoso que não

me deixa o ar e me 

impede a mastigação 

tentando minha morte por

suicídio ou inação 

Jardins

 


afoguei cactos

matei de sede azaleias 

mas nunca nunca deixei 

secar bromélias na vã 

esperança de nascerem sapinhos

do tamanho de polegares 

as sementes de melancia cuspidas

no quintal não

nasceram mas se

adubam hortas com cascas de

mexerica e acordam 

desejos o cheiro impregnado nos

dedos que a despe o

tempo de livrar-se do seu

perfume é o mesmo tempo

das estiagens em África

ou no nordeste brasileiro 


domingo, 6 de novembro de 2016

Spotify

 


é que a gente é 

moderninho e fode ao

som de liniker,

alafia, johny hooker e

transa do caetano que é

pra parecer bem cult

conhecedor da tropicalia

a gente só não

fode ao som

de cicero porque não dá

pra foder ao som de

cicero apesar do tesao que

da com o teu 

corpo colado no meu

no meio da valsinha

mas o lance é que a gente

fode menos que a geração de 

70 mais do que a de 

50 chapando com 

maconha, clarice lispector,

catuaba e ana c.

e nada de doce porque

falta os 30 conto pra

bancar a viagem 

e a gente fode com

homem e mulher e

vive fantasiando pra

foder com os dois juntos 

enquanto goza com

o chuveirinho do box

ouvindo baiana system 

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

horário de verão



quanta claridade me
invade ainda as
seis sete ou oito ainda
não escureceu o
sexo no claro vendo
seu maxilar travar enquanto
goza ejaculando dentro da
camisinha de Vênus ou
látex e minha atenção nos
nós do seu cabelo pra
desfazer mais tarde
quase terapia assim
como espremer cravos e
espinha dorsal que
de torta travou e
pôs dor nas 
pernas braços bacia
e frida me desenhando 
nela coluna partida e o
sexo com alguma 
garota em paris

Ibiuna n.2



enche a casa arrasta
os móveis os
livros espalhados pela
sala aqui 
dentro frio enrolado
em coberta
lá fora muito
clalor e o sol na pele
arde na noite 
seguinte queimadura
mesmo tremendo dois
cobertores e o corpo
enrolado em quem quer
que seja pra não
tremer falta de sono 

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Ibiuna n.1



talvez na barraca 
fingindo acampamento na 
sala de aula ou no
quintal do sítio você sinta
mais tesão por mim ou lembre
da discussão com ela ou
das duas transas com
outra em outro 
estado em outra
cidade com vista 
pro mar e a traição 
é me deixar em cidade
fria sem sol me 
aquecendo na fogueira 

sábado, 15 de outubro de 2016

Prosa russa II


barriga embrulhada
hipócrita a tatuagem
no braço esquerdo
e fecha a porta do cafofo
parece armário
cheirando a mofo
e aquela barata
saindo do esconderijo
enquanto a gente
transava sentado na cadeira
fechei os olhos e gozei alto
e o amor pelo rabo da Naiara
que não me saía da cabeça
e pedagogia doutrinaria de Tolstoi
querendo discutir literatura
visão classista e pá
e o enrosco
pra escrever a palavra
classista
flertei
foi sem querer
mas ela sorria de volta
a sapatilha vermelha
meia calça preta
vestido preto e branco
casaco a combinar com os pés
posição de dama
bem educada
francesa cabelo chanel
me olhando feito amelie poulain
e eu já sei
meus ossos mesmos tortos
não são de vidro
a grande volta da frança
não faz fronteira
com a prosa russa

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Ernesto


das coisas que a gente não
confessa
mas era fácil ...
te dizer
depois que
você sai da cama
me agarro ao travesseiro
na falta do Pedro Diego meu
urso de pelúcia
como se
fosse a personagem do livro de
Antonio Lobo Antunes
que você me deu de aniversário
e que não
consigo terminar
que cansei de encontrar sangue
nas minhas unhas que crescem rápido
e as feridas
nas minhas pernas que
você acha tão bonitas nunca saram
é que não tenho
me cuidado
me achado bem mais pequena
que meus 1,67 de altura
e foi pra isso que comecei
a tomar a sertralina e o frontal
pra dormir
porque não tem mais
mãe pra me ajudar
as vezes acho
que nunca teve
e ter voce
ao meu lado nem parece real
quando tenho que
ser sempre sozinha
meu quarto vem
acumulando poeira
mas quando
tenho tempo pra varrer
e tomar o polaramine
pra que essa alergia não me mate
eu tenho
preferido dormir
e dormir
para sempre
porque enquanto
sono não existe
vida pra sobreviver
mas ainda
tem os pesadelos
e o seu abraço quando acordo
assustada na beira
da cama
como se
fosse abismo de onde
não quero me atirar para o vôo
porque nem sempre
é vôo
e as vezes queda que me
machuca demais
e cansei
ou desisti
cansaço ou desistência
de me levantar e
tirar a poeira das
feridas que sangram
e a apatia de nem
saber o que quero
comer na janta

sábado, 10 de setembro de 2016

Capitão gancho responde


não tem pistas no metrô
o trem anda na via
o objeto cai na via
o corpo se joga na via
mas isso é só palavreado de metroviária
da profissão de meus pais e
minha mãe confessando eu não
queria que você fosse metroviária e
meu pai dizendo é só o tempo dela
escrever um livro
mas se
ele soubesse que não
tenho coragem
de soltar meus poemas muito longe
mas se
você soubesse que nunca
quis
te jogar na via
e que foi verdade eu
pedindo pra
você me mostrar seus poemas
ainda teria ódio dentro
de ti pra mim

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Apontamentos sobre a insegurança


me atinge no meio do dia
sem aviso prévio
uma certeza
de que você amou
mais que a mim
todas as outras mulheres

Jabaquara


viagem
tédio
e o zunido do ônibus
noturno
era preciso acender a luz
pra ler um livro
medo de atrapalhar os outros que
dormiam
sempre esse
medo de atrapalhar os outros
cedi
nas luzes laranjas do túnel
quentes
dormi
e o zunido do ônibus
tornou lembrança
zunido do mar
de cor azul fria
que meus pés não aguentavam
imaginado
dentro da concha

Bicicleta azul


é preciso que meu ouvido doa
inflame com o vento
pra eu acreditar que minhas
pernas ainda tem força pro
pedalo
apesar do meu joelho que
vêzoutra falha no meio do
makuru
que a bicicleta correndo pela orla
teus cabelos de cachos tão pequenos
contra o vento
não é sonho
ainda que eu já tenha sonhado mas
o céu cinza e não
azul
a imperfeição desses momentos
da quebra de clímax com
gargalhada
e a minha ferida atrás da orelha
e a coceira na dobra do joelho esquerdo
lembram que existe
o real
Quero voltar pros dias de calmaria. Sem choro convulso. Os dias à beira da praia. Passando frio ou sentindo o sol queimar a minha pele. Sem a preocupação de bater o ponto sem atraso no dia seguinte antes do sol nascer. Com a única preocupação de escolher que comida gostosa vamos almoçar e se dá tempo de cochilar antes do almoço. Quero de volta os dias sem o emprego público que eu nunca quis, mas que é a única opção pra pagar o aluguel no fim do mês e ter alguma "liberdade", pra pagar o almoço gostoso, os shows pra lavar a alma no fim de semana, as viagens à praia pra ver o mar e lembrar dos seus sonhos. Quero de volta tudo o que não seja esse medo de tudo o que existe fora desse quarto e a incapacidade de cumprir com as responsabilidades dessa vida mediana a qual a gente tenta sobreviver dia após dia. Quero de volta os dias de café na cama e você sentado na janela. Quero de volta os dias de carnaval, de show de Cícero, Maurício Pereira, Mahmundi e Aláfia. Quero de volta os dias de Ribeirão Pires, Paraty e Peruibe. Quero tudo que não seja aqui.

Esqueleto de lagartixa


foi de propósito
a lagartixa
que eu esmaguei no portão de
casa foi de propósito
eu sei que
disse foi sem querer
mas a vi pequena antes de
bater o portão
contra o batente
brincar de deus e
sentir mesmo que
sobre outro
corpo o meu
controle já que
meu corpo não
me pertence
e pensei
que se o portão esmagou
lagartixa podia
muito bem
esmagar o meu dedo mindinho
quinze dias sem trabalho e tempo
pra pensar
se pulo ou nao na
frente do trem
inventar pra mim um
deus que alivie
porque não
é possível tanta
lágrima em um
só peito
e hoje tem no
batente do meu portão
o esqueleto esmagado
do que já
foi lagartixa

quarta-feira, 20 de julho de 2016

[diário de dias ruins]


15 de julho. Eu estava certa. Decidida. Viajaria sim ou sim. Veria o mar pra me livrar de todas essas tragédias que revivo e sobrevivo em São Paulo com a ajuda de uma amiga. Mas vem sem avisar essa tristeza enorme que eu quero que não suba a superfície, e que quando por um acaso desconhecido sobe que cesse o mais rápido possível. Às vezes basta uma frustração pequena e eu como uma criança mimada me ponho a chorar. Mas é que eu preciso que você entenda que a vida já tem me cobrado tanto, me tirado tanto, que quando mais um plano, mais um desejo meu falha tudo aqui dentro desaba mais uma vez e vem essa tristeza, essa dor que se transforma em física e o choro incessante. Às vezes não ocorre nada e o choro já brota. E quando começa esse desaguar não há nada que faça parar. Machuco meus olhos de tanto enxugar lágrimas. E tudo só acaba com o cansaço e o sono me fazendo dormir pra amanhecer de olhos inchados e com vergonha de ser fraca e deixar essa tristeza me dominar por inteira. E acordo com o medo de que não consigo prosseguir sozinha é uma viagem é impossível longe de quem segure minhas mãos e me faça respirar no meio dessas crises. Vou ficar em São Paulo sem ver o mar.

sexta-feira, 8 de julho de 2016

Mingau de farinha láctea com achocolatado


[ou pro Yuri se ele quiser]

no meio das palavras de ódio
que escrevo
pra desafogar qualquer coisa em mim
no meio do dialogo corrido
cheio de libido e de vontades inconfessáveis
pausa
tento encontrar de novo as palavras delicadas
pra me declarar
entre panelas de mingau com chocolate
divididas
colher contra colher disputando a raspa da panela
abraços quentes depois do gozo
e uma preocupação de se estar bem
a falta de vontade de sair do abraço
pra servir a maquina na manhã seguinte
o sorriso aberto
e mais e mais vontade
de transa
de dizer que ama
de acalmar o choro
e o gosto do queijo roquefort
e do vinho que ta vinagrando na minha cômoda
no nosso beijo
e as fugas da policia
e nossos corpos dançando no meio da pista
e os shows que eu quero mais
assistir a final de basquete na minha cama
e vibrar com aquele toco do Lebron James
estourar cravinhos e espinhas
como se fosse carinho
e não conseguir nunca chegar ao fim

quinta-feira, 7 de julho de 2016

Desculpas de um relacionamento aberto


desculpa,
eu não quis ficar doente naquela noite
em que você transava com ela 
não foi planejada aquela garoa
enquanto você fudia com ela
não foi psicológico
não foi emocional
foi a madrugada mais fria do ano
e eu esqueci meu cobertor
onde a gente dormiu junto pela ultima vez
e em casa não tinha coberta suficiente
pra parar o frio
e eu sentia dó do meu cachorro dormindo no tapete
mas quando eu acordei
e ainda garoava
eu descobri que a coberta encostou no chão
e ele se escondeu debaixo dela

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Tragédias previsíveis


[acho que me traumatizou as horas excessivas assistindo "Premonição" e suas seqüências intermináveis]
prevejo tragédias
das mais pequenas
as fatais
perder o horário do ônibus
pegar o ônibus errado
viajar para onde eu não conheça e não queira
me perder sem saber como voltar
acidente de ônibus
eu rolando ribanceira a baixo
as pessoas que gostam de mim chorando
e o vizinho de poltrona querendo foder comigo
antes da morte
e a ultima visão dele
minhas cochas magras na saia curta demais
na batida com o caminhão na contramão
o sequestro pelo taxista
roubo
estupro
assassinato
o golpe do falso hotel
dormir na rua
sem dinheiro
sem ter como voltar
o atropelamento na ponte estreita
assalto
sequestro
estupro
assassinada
na noite escura
em São Paulo, Goiânia, Paraty ou Salvador
a queda na ponte estreita
afogamento no rio que desemboca no mar
ou o muro da rua da minha vó
caindo sobre mim
me matando esmagada
sem documento
sem ninguem saber que eu estava lá
que fui eu os restos
carne
sangue
osso
na calçada
melhor limpar os restos
antes da saída das adolescentes uniformizadas do colégio da rua de cima

terça-feira, 28 de junho de 2016

[diário de dias ruins]


26 de junho. Bati o cartao três minutos atrasada. Menos de uma hora depois começou o choro na catraca. O enjôo. A ânsia. A ansiedade. Machuquei meu olho de tanto enxugar choro. Não sabia se era o namoro, o trabalho, a insegurança, a coluna, o que me fazia chorar. Mas não parava. Só o choro desesperado. A espera de alguma mensagem que me acalmasse. Mas nada. Bati o cartão. Vi pessoas e me fingi, ou talvez fui mesmo, feliz. Mesmo com a dor, com a ânsia e a insegurança. As pessoas foram embora. E chorei de novo, desesperadamente, confessando todos os meus medos, impotências.

A morte do passarinho da minha irmã


- o passarinho morreu, você viu?!
- não vi
ninguém reparou
amanheceu morto
não amanheceu
não acordou
o outro passarinho
lá parado
olhando pro corpinho frio
ninguém chorou
a gente só alimentava ele
não brincava
- ele ficou bravo porque não chorei
guardei o corpinho
ele levou mais cedo
enterrou lá no quintal
eu também não chorei
nem senti nada
o passarinho foi presente
pra minha irmã
quando eu era criança
não adiantava pedir
pra minha gralha ficar
eles não deixavam ela ficar
um pouco menos mimada
mas hoje ainda tenho medo
das adolescentes
uniformizadas
na saída dos colégios

[diário de dias ruins]


17 de junho. Acho que é ansiedade. Deve ser isso. Chegou no meio da tarde um sono e uma preguiça de fazer as tarefas necessárias. Fui pra cama. Li um capitulo de Waly Salomão. E dormi. Não vi a Bruna chegando. E não recebi nenhuma mensagem que me interessava. Acordei chorando porque o dia tinha acabado e amanhã volto pro trabalho. Tava meio em paz de trabalhar só o fim de semana. São dias mais fáceis. Mas de repente uma ânsia. E você me encontra de pijama querendo desistir de tudo. Esquece que combinamos de comer fora. E eu fico ali sem saber se deixo a tristeza me dominar ou racionalizo que não, que não há nenhum problema em esquecer as coisas. Amanhã é meu aniversário. Na hora de dormir me deu um desespero de ficar mal de novo. Mas dormi.

Pedindo ajuda

Um dia ela me viu chorando e me mandou mensagem no face perguntando se eu estava bem. Eu não estava, mas me aqueceu saber que ela se importava. Hoje ela escreveu sobre os dias dela e era tão eu ali que resolvi tentar isso também. Escrever pra exorcizar.
Passei o dia chorando. Tenho feito muito isso. De vez em quando. E algo me impede de mandar mensagem pedindo colo as pessoas que me amam. E eu sei que elas existem. Por mais que tudo que eu queira pedir seja socorro nessas de mensagens escritas e editadas eu me finjo bem e forte. Enquanto choro na cama e sinto uma dor que se transforma em mal estar físico e me impede de tudo. Depois eu durmo mal, acordo com os olhos inchados mas começo outro dia e finjo sorrisos e felicidades passageiras, que ate chegam a ser reais. Passo dias de tranqüilidade e alegria pra depois tudo desaguar de novo. Choro. Hospitais. Ânsia. E a certeza de estar destruindo tudo aquilo que construí. Uma montanha russa tão previsível que no meio da dança e do beijo na boca, agarrada no colo dele ou dela eu quero chorar porque sei que irei amanhecer tristeza e pânico. E tudo volta e tudo recomeça. Me sinto presa num pântano, atolada, e quanto mais força eu faço pra sair mais me afundo e não consigo me agarrar a nada. Só afundo. E é longo esse afogamento.
Acho que finalmente consegui escrever pedindo ajuda.

Para não se realizar o desejo de pular na frente do trem


É sempre aquele desejo de pular na frente do trem
Mas naquela estação tinha porta na plataforma
E eu fiquei só na vontade 
Quis arrancar meu útero hoje
Porque ele sangrava e doía
Como quero arrancar cada parte que me dói
A coluna torta
A perna esquerda maior que a direita
O peito trancado no sutiã
E o rebuliço que me revira o estômago
E que eu não conseguiria apalpar
Porque nem sei se ele é real
Se existe
Se é físico
E se meus dedos alcançam
Entre sangue e vísceras
Quis me livrar de tudo que era eu
Mas nem sinto mais aquela tristeza de canteiros
Mas ainda me lembro
Das lágrimas que não ficavam nos lençóis
Que se estendiam entre caminhos obrigatórios
Pra servir mais um dia essa maquina da vida
Mas
É sempre aquele desejo de pular na frente do trem
Impedido
Por
Aquele sempre desejo de mudança

Líquido preto


Tenho bebido o café quente
Queimado os lábios
Em palavra
Por desespero
Com uma pressa
Pelo gosto
Impaciência pelo morno
Tenho me engasgado
Regulado mal
Válvulas internas
Me afogando
Um pouco a cada dia
Em meu pulmão
Líquido preto
Que me aquece
Prazerosa dor
Que me cauteriza

Porque hoje escrevo com ódio


Troquei meus versos simples
Delicados, suspirosos
Facilmente reconhecíveis
Por ódio
Porque ser a menina boa
Que no fim vai dar carinho
Chorando diante da contradição
Tão bonita e frágil
Cansa pra caralho
E meus versos agora são desbocados
Cheios de "porra", "caralho", foda", "puta que o pariu"
E eu respeito as putas mais que tudo
Porque esse desejo de foda
Que move a gente a cometer erro
E atirar no outro mesmo de olho aberto
E enxergando que a mira ta no alvo
É mercado escandaloso
E o corpo da mulher é objeto
Que da dinheiro amargo de dor
De estupro
De assedio
De foda forçada, mas que foi paga
Então ta tudo bem
Então tudo pode
E você nunca vai entender a minha raiva
Quando soube que você já foi no puteiro
Nao uma única vez
Mas mais que isso
E meu ex também ia
Foram mais de dez vezes com certeza
E acho que nunca mais amei ele depois disso
Mas "filha da puta"
nunca foi xingamento
Porque fui filha de vadia mesmo
Que deu antes do casamento
Mas também troquei minha poética por ódio
Porque é preciso desafogar
Para que eu não grite na sua cara
Que eu existo
E que fingir que não me enxerga não vai mudar nada
E para que eu lembre
Que ter ódio de você é contra revolucionário
E o mundo já é uma bosta tão grande
Que rivalizar com você nao tem nem sentido
Ainda mais sendo o motivo uma pica
Que me faz gozar igual o brinquedinho prata
Que um outro ex me deu
Com o bônus de que só precisa de duas pilhas
e nada mais

sábado, 28 de maio de 2016

Sobre aquela briga sem porque

Encontrei uma gravação ainda mais bonita daquela música que te mostrei há muito tempo, quando a gente ainda nem sabia se a gente queria ser a gente. Quis te mandar na hora, abri sua página no face, copiei o link, mas lembrei das mensagens trocadas mais cedo e deixei pra lá. Fiquei sozinha ouvindo a música. Pra ver se aliviava, mas nada aliviava.
O que desatou o choro foi a falta de carinho, foi que o diálogo que eu esperava não aconteceu e minha insegurança falou mais alto do que de costume e dominou qualquer tipo ou possibilidade de expressão minha.
E desatei a falar tudo o que eu sentia, que me confundia, que me sufocava. E do teu lado por mais que você falasse era silêncio diante do que eu gritava. Descaso, destrato, mesmo que você não quisesse - e eu sei que não queria. Era. É que as vezes a gente não é mesmo o que o outro precisa, o que o outro espera. A gente é só o que a gente pode ser, mesmo.
E nada deixava mais leve o peso no meu coração.

Poema de ódio e desvario porque a vontade de foda é maior que a fome


Ela quebrou o espelho do banheiro
A fita cassete
E o liqüidificador
Deu fantasiada de mulher fatal
No local de trabalho
E todo mundo soube
A lingerie rasgada no chão
Ela chorou tantas vezes
Planejou vida nova
E fugiu de casa
Drama pronto
Mais trágico que eu
Pondo as coisas dele pra fora
Recolhendo as roupas pra devolução
E o choro convulso de mais um termino que nao consegue ser fim
É melhor beber agora
Fumar um
Beijar quantas bocas puder
Pra manter a sanidade
E terminar qualquer briga numa foda boa
Em que eu rezo pra não gemer muito alto
E pra ele não gozar antes
Abortando qualquer possibilidade de final feliz pra essa noite
Depois a gente dorme
E o choro convulso fica pra outro dia
E ela se desfaz do espelho quebrado
Da fita cassete quebrada
Do liqüidificador quebrado
E volta pra casa porque não sabe viver em outro lugar
De outro jeito
Sem ser casada
Mulher de casa
Infiel
Julgada pelas fodas que não foram dele
E a gente no desvario de romper o ciclo
Sonha com uma comunidade de mulheres
Mas tanto faz se a outra só quer fuder
Mesmo sabendo do meu sangue atravessado
Porque sororidade é meu cu
Que eu dei naquela noite mesmo depois de jurar que nunca faria
Mas que foi bom
E me fez gemer alto
E minha perna tremer
Lembrando dela me comendo com o dedo
Enquanto eu agarrava seus seios

A poeta sem emprego


Porque ser poeta sem ter que bater cartão no dia seguinte
É facil
Queria ver você no meu lugar
Passando mal diante do relógio de ponto
E ainda assim, querendo fazer verso com a dor
Dormindo de cansaço no banco do onibus
Batendo a cabeca contra a janela
Enquanto sonha em fazer poesia
Fui acordada no terminal de onibus
E tive qua andar de volta três pontos
Quase corrida
Pra nao chegar atrasada no sarau
Ser poeta e pagar o aluguel com o dinheiro do pai
Qualquer um pode
Quero ver rimar
Diante do caixa eletrônico
Percebendo que esse mês não vai dar
Ou até ter dinheiro sobrando
Mas descartar aquela viagem no fim de semana com os amigos
Porque a folga só cai na quarta
Quero ver recitar teus versos
Diante dos gritos da tua chefe na frente de todo mundo
E deixar sonoro o assédio
No fim escrevi um poema de inveja
Das tuas tardes livres
E teu tempo pra ler poesia em voz alta no meio da biblioteca

Sobre as ultimas noticias e mulher


É que eu recebi a noticia
Mas não deu pra acreditar
Era tão absurdo
Mas ai foi bombardeando em mim a noticia
Me atingiu de uma vez
Me atingiu aos poucos
Igual afogamento
Quando a onda atinge a gente em cheio
Mas a gente fica lá de baixo da água vendo tudo em câmera lenta
Ate que sobe pra respirar desesperado
E tudo arde com o salgado do mar
E me faltou a respiração
No meio do trabalho
Quase me veio o choro
Mas lembrei que não é apropriado chorar no local de trabalho
Não demonstrar fraqueza
Não demonstrar impotência
Mesmo quando o colega chama você de gostosa achando que é brincadeira
E a gente treme de raiva
Porque o corpo é nosso e a gente não queria aquilo
E eu nunca soube como um procedimento pode me dizer
pra não limpar a porra das roupas delas
Porque é preciso da prova pra dizer que aconteceu
Porque palavra de mulher vale menos que papel molhado
E que pro choro convulso dela no telefone
Dizendo que sonhou com o estupro dela
Eu não tive resposta
E eu lembro de quando fui na casa dela
E me sentei no sofá
Onde meses depois eu saberia que aconteceu o crime
E eu quis queimar o sofá
E se pudesse queimava todas tuas lembranças
Pra você não acordar mais chorando no meio da noite
E nem ter mais medo de dormir sóbria

sábado, 19 de março de 2016

Estamos em guerra, meu amor

Na madrugada estourou bombas
Tiros
Feridos e presos, meus companheiros
Fugi
Me refugiei
Você sentado na janela
Eu nua em sua cama
Café e cigarro
Tarde de sol
Dias de tranquilidade
Que a polícia não perdoa
Nós rimos
Mas lá fora estamos em guerra
Eu, você e nossos companheiros
No fundo do riso um ódio
Em nosso carinho um desejo de revolução

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Amar infinitamente plural

Me disse doce:
- Eu estava escrevendo o nome dela em uma folha, comecei a desenhar o rosto dela... Mas amassei e joguei fora. O que isso significa?

Quis responder que significava que eu amava estar ali ao lado de quem sabia amar infinitamente plural.

domingo, 10 de janeiro de 2016

sábado, 9 de janeiro de 2016

Noite inteira

Minhas pernas tremem
As pontas dos dedos formigam
E eu caibo inteira no seu sorriso
Te mordo e te mastigo
Pra ter de ti todos os gostos
Ocupando a boca em um beijo
Pra não declarar besteiras
Decorando seus traços sob a luz clara
Te sussurrando "obrigada"
Pela entrega inteira
Do meu corpo, meu desejo
Meus gritos e gemidos
Seu nome, meu nome ao pé do ouvido

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Sobre vomitar coelhinhos e Dafne

Era só dor de garganta e eu sabia disso, com a racionalidade de antes eu sabia que era só dor de garganta. Que esse arranhar era só catarro e inflamação das chuvas que tinha tomado no mês de dezembro pra acabar o ano, o namoro, as esperanças de novo romance, as expectativas dela doente. Racionalidade: apenas catarro e inflamação, dor de garganta. Mas depois de Cortázar eu tinha a certeza irracional que era um coelhinho, que eu não sabia vomitar, que me coçava a garganta.


Quis ligar para Dafne e dizer: "tenho um coelhinho preso na garganta". Ela entenderia...

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016