sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Café


            Dois homens sentados a minha frente terminam o namoro. A decisão é racional e foi muito bem pensada. O mais novo dos dois chora e o outro o busca com as mãos na tentativa de cessar as lágrimas. Eles ainda se beijam, dividem um copo de café e se olham... Na mesma mesa que eu duas garotas de aliança na mão sorriem. Uma lê Cristiane F., a outra estuda matemática e me sorri de vez em quando. Eu sorrio de volta... Ao meu lado se sentam três homens, cada um com um caderno de desenho nas mãos. Tiram das mochilas lápis, canetas, pinceis e começam a desenhar... Me levanto para ir embora, olho todos na sala, coloco minha mochila nas costas, dentro dela minhas sapatilhas. Sorrio, mas não me despeço de ninguém.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

"Me morde..."

No vale dos seios
Pinta solitária
Desenhada por encanto
Pingo de tinta
Caiu na pele branca
A boca no cume
Os dentes a querer rasgar

domingo, 22 de fevereiro de 2015

Saudade de Lígia

Ainda lembro de nós duas sentadas no banco em frente a biblioteca olhando pro gramado verde. Você olhou pro céu e disse que adorava dias cinzas, olhou pra minha cara fechada de quem odeia dias cinzas e então voltou a dizer: “esqueci que você fica chateada em dias cinzas, prefiro dias claros que você tá alegre!” – o dia não era mais cinza naquele instante...



quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Carnaval

Descompassava o sorriso no rosto
Menina dançava que nem sentia
Como se fosse o mundo de Chico
Todo mundo reparava nas flores que ela vestia

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Relógio de ponto


Quando eu ia para o trabalho pensei em me atirar nos trilhos do trem. Mas pensei que seria maldade te fazer recolher meus pedaços... Noite passada minha tristeza quase abriu uma cicatriz em nós dois. Quando o trem saiu do subsolo e chegou a parte elevada vi o céu. O sol tentava romper as nuvens e nascer. Riscava o negro das nuvens de um azul esverdeado querendo ser amarelo. Achei bonito e sorri antes de deixar parte da minha vida no relógio de ponto. Talvez eu a resgate daqui oito horas e meia quando eu bater o cartão marcando minha saída. Talvez não, talvez nem no banho, talvez nem em sonho, talvez nem na conversa com amigos eu recupere o que deixo no relógio de ponto. Talvez nem dormindo com você, meu bem. Talvez nem dançando.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Os olhos cheios de desejo


Deslizo sobre o seu corpo
A cena toda em câmera lenta
Movo os quadris
Suas mãos em minha cintura
Sigo o ritmo
Lascívia
Fecho os olhos
Respiro fundo
E mergulho de novo
Tendo você cada vez mais fundo em mim
Apoio minhas mãos sobre o teu peito
Afundo as unhas na carne
Busco os olhos cheios de desejo

sábado, 7 de fevereiro de 2015

A casa vazia. Vazia.



            A casa vazia. Mas escuto a minha cachorra tomando água e meus pais se mexem na cama. A madeira estala. Inspira e respira. O som da respiração pesada vem da cama ao lado e é da minha irmã. A casa está vazia. Escuto cada gota caindo na cama. O choro é livre porque a casa está vazia. Nenhum deles irá me mandar mensagem que diga que eles estão vivos e que ainda gostam de mim. Vazia. Sinto falta de alguém que me mande pra cama na hora certa. Simulo um diálogo e me deito sozinha. O relógio apita. Já é tarde demais. A casa vazia. Vazia.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Ballet



Faz catorze graus
E sinto meu corpo quente
Os joelhos tremem
Mas as pernas nunca tão fortes
Ensaio sentir sua falta
Mas estou completa
Sou grande
Pernas
Braços
Me finjo pequena
Engano a ti e a mim
Ilusão que preciso de abrigo
Mas sou eu quem tenho abraço aberto
E guardo o mundo

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Gestos




            Trouxe ela pra casa por acidente. Ela me sorriu e eu a quis aqui comigo. Não sabia nada dela e mesmo assim a queria. Notei cada gesto dessa desconhecida que eu sonhava agora em minha cama e que eu queria devorar mais do que a própria fome. Ela ficava nas pontas dos pés sem necessidade alguma, já era alta o suficiente pra tudo; as vezes ate ganhava alguns centímetros de mim quando se aprumava. Quando ia escovar os dentes usando a minha escova deslizava o pé direito pela perna esquerda até ele encostar no joelho, e o deixava ali enquanto se olhava no espelho e via a espuma se formando entre os lábios que eu mordia com um apetite que eu tentava negar. Tinha mania de se jogar no chão e deitar com uma perna sobre a outra, os pés esticados, tão juntos que pareciam um só. E o sorriso aberto e lindo. Eu não entendia nada do que ela falava, era sempre eu quem falava mais. E ela sempre a ouvir com os olhos de jabuticaba que olhavam nos meus ao ponto de me queimar e me fazer fugir com os olhos para qualquer outro lugar.