terça-feira, 28 de junho de 2016

[diário de dias ruins]


26 de junho. Bati o cartao três minutos atrasada. Menos de uma hora depois começou o choro na catraca. O enjôo. A ânsia. A ansiedade. Machuquei meu olho de tanto enxugar choro. Não sabia se era o namoro, o trabalho, a insegurança, a coluna, o que me fazia chorar. Mas não parava. Só o choro desesperado. A espera de alguma mensagem que me acalmasse. Mas nada. Bati o cartão. Vi pessoas e me fingi, ou talvez fui mesmo, feliz. Mesmo com a dor, com a ânsia e a insegurança. As pessoas foram embora. E chorei de novo, desesperadamente, confessando todos os meus medos, impotências.

A morte do passarinho da minha irmã


- o passarinho morreu, você viu?!
- não vi
ninguém reparou
amanheceu morto
não amanheceu
não acordou
o outro passarinho
lá parado
olhando pro corpinho frio
ninguém chorou
a gente só alimentava ele
não brincava
- ele ficou bravo porque não chorei
guardei o corpinho
ele levou mais cedo
enterrou lá no quintal
eu também não chorei
nem senti nada
o passarinho foi presente
pra minha irmã
quando eu era criança
não adiantava pedir
pra minha gralha ficar
eles não deixavam ela ficar
um pouco menos mimada
mas hoje ainda tenho medo
das adolescentes
uniformizadas
na saída dos colégios

[diário de dias ruins]


17 de junho. Acho que é ansiedade. Deve ser isso. Chegou no meio da tarde um sono e uma preguiça de fazer as tarefas necessárias. Fui pra cama. Li um capitulo de Waly Salomão. E dormi. Não vi a Bruna chegando. E não recebi nenhuma mensagem que me interessava. Acordei chorando porque o dia tinha acabado e amanhã volto pro trabalho. Tava meio em paz de trabalhar só o fim de semana. São dias mais fáceis. Mas de repente uma ânsia. E você me encontra de pijama querendo desistir de tudo. Esquece que combinamos de comer fora. E eu fico ali sem saber se deixo a tristeza me dominar ou racionalizo que não, que não há nenhum problema em esquecer as coisas. Amanhã é meu aniversário. Na hora de dormir me deu um desespero de ficar mal de novo. Mas dormi.

Pedindo ajuda

Um dia ela me viu chorando e me mandou mensagem no face perguntando se eu estava bem. Eu não estava, mas me aqueceu saber que ela se importava. Hoje ela escreveu sobre os dias dela e era tão eu ali que resolvi tentar isso também. Escrever pra exorcizar.
Passei o dia chorando. Tenho feito muito isso. De vez em quando. E algo me impede de mandar mensagem pedindo colo as pessoas que me amam. E eu sei que elas existem. Por mais que tudo que eu queira pedir seja socorro nessas de mensagens escritas e editadas eu me finjo bem e forte. Enquanto choro na cama e sinto uma dor que se transforma em mal estar físico e me impede de tudo. Depois eu durmo mal, acordo com os olhos inchados mas começo outro dia e finjo sorrisos e felicidades passageiras, que ate chegam a ser reais. Passo dias de tranqüilidade e alegria pra depois tudo desaguar de novo. Choro. Hospitais. Ânsia. E a certeza de estar destruindo tudo aquilo que construí. Uma montanha russa tão previsível que no meio da dança e do beijo na boca, agarrada no colo dele ou dela eu quero chorar porque sei que irei amanhecer tristeza e pânico. E tudo volta e tudo recomeça. Me sinto presa num pântano, atolada, e quanto mais força eu faço pra sair mais me afundo e não consigo me agarrar a nada. Só afundo. E é longo esse afogamento.
Acho que finalmente consegui escrever pedindo ajuda.

Para não se realizar o desejo de pular na frente do trem


É sempre aquele desejo de pular na frente do trem
Mas naquela estação tinha porta na plataforma
E eu fiquei só na vontade 
Quis arrancar meu útero hoje
Porque ele sangrava e doía
Como quero arrancar cada parte que me dói
A coluna torta
A perna esquerda maior que a direita
O peito trancado no sutiã
E o rebuliço que me revira o estômago
E que eu não conseguiria apalpar
Porque nem sei se ele é real
Se existe
Se é físico
E se meus dedos alcançam
Entre sangue e vísceras
Quis me livrar de tudo que era eu
Mas nem sinto mais aquela tristeza de canteiros
Mas ainda me lembro
Das lágrimas que não ficavam nos lençóis
Que se estendiam entre caminhos obrigatórios
Pra servir mais um dia essa maquina da vida
Mas
É sempre aquele desejo de pular na frente do trem
Impedido
Por
Aquele sempre desejo de mudança

Líquido preto


Tenho bebido o café quente
Queimado os lábios
Em palavra
Por desespero
Com uma pressa
Pelo gosto
Impaciência pelo morno
Tenho me engasgado
Regulado mal
Válvulas internas
Me afogando
Um pouco a cada dia
Em meu pulmão
Líquido preto
Que me aquece
Prazerosa dor
Que me cauteriza

Porque hoje escrevo com ódio


Troquei meus versos simples
Delicados, suspirosos
Facilmente reconhecíveis
Por ódio
Porque ser a menina boa
Que no fim vai dar carinho
Chorando diante da contradição
Tão bonita e frágil
Cansa pra caralho
E meus versos agora são desbocados
Cheios de "porra", "caralho", foda", "puta que o pariu"
E eu respeito as putas mais que tudo
Porque esse desejo de foda
Que move a gente a cometer erro
E atirar no outro mesmo de olho aberto
E enxergando que a mira ta no alvo
É mercado escandaloso
E o corpo da mulher é objeto
Que da dinheiro amargo de dor
De estupro
De assedio
De foda forçada, mas que foi paga
Então ta tudo bem
Então tudo pode
E você nunca vai entender a minha raiva
Quando soube que você já foi no puteiro
Nao uma única vez
Mas mais que isso
E meu ex também ia
Foram mais de dez vezes com certeza
E acho que nunca mais amei ele depois disso
Mas "filha da puta"
nunca foi xingamento
Porque fui filha de vadia mesmo
Que deu antes do casamento
Mas também troquei minha poética por ódio
Porque é preciso desafogar
Para que eu não grite na sua cara
Que eu existo
E que fingir que não me enxerga não vai mudar nada
E para que eu lembre
Que ter ódio de você é contra revolucionário
E o mundo já é uma bosta tão grande
Que rivalizar com você nao tem nem sentido
Ainda mais sendo o motivo uma pica
Que me faz gozar igual o brinquedinho prata
Que um outro ex me deu
Com o bônus de que só precisa de duas pilhas
e nada mais